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- DirectorWilliam A. WellmanStarsCarole LombardFredric MarchCharles WinningerAn eccentric woman learns she is not dying of radium poisoning as earlier assumed, but when she meets a reporter looking for a story, she feigns sickness again for her own profit.Primeira ‘screwball comedy’ colorida, o roteiro de Ben Hecht é como um primeiro rascunho ligeiro e cínico até a medula. E, pelo o que se sabe, é bem por aí mesmo – alega-se que Hecht o escreveu em duas semanas, desentendeu-se com os produtores e não quis mais saber. O IMDb lista nove contribuições não-creditadas, até o produtor David O. Selznick, metendo o dedo no texto. Milagre o resultado ser mais afinado do que a bagunça anunciada. Hoje pode até parecer que o filme desate seus nós de maneira inconsistente, mas a crítica ácida ao jornalismo criando celebridades a partir de dramas pessoais é parte da sofisticação cômica da época. Sem esquecer a presença de Carole Lombard, em seu auge, iluminando a direção com timing um tanto irregular de William A. Wellman, no mesmo ano em que também dirigiu a primeira versão de ‘Nasce uma Estrela’|1937. A cena de Lombard e Frederic March ‘brigando’, apesar de apreciada com outro viés na contemporaneidade, no contexto da produção, em frente e atrás das câmeras, é icônica.
* * * Monteiro Júnior
02.07.20 - YouTube, quarentena covid-19 - DirectorRichard LangStarsDennis WeaverValerie HarperRobin IgnicoA young girl begins seeing the ghost of her sister who died in an accident a year earlier.Em certos aspectos esse eficiente e pouco lembrado terror realizado direto para a televisão – embora no Brasil tenha ganhado status de cult pelas exibições e reprises durante a segunda metade da década de 1980 – antecipa elementos que veríamos em obras como ‘O Sexto Sentido’|1999. Apesar do roteiro de Ned Wynn ter algumas ligaduras frouxas no desenrolar do enredo, a premissa sobrevive bem. Surpreende como a direção de Richard Lang, a despeito das restrições do formato, tenta equilibrar a atmosfera sobrenatural com uma pegada psicológica e um peso dramático na melancolia familiar. É uma história fundamentalmente triste, na maneira como a tragédia vai se abatendo sobre a família de Dennis Weaver [sim, o motorista perseguido de ‘Encularrado’|1971] e impregnando o enredo com um sentimento de solidão. Isso permanece conosco talvez mais do que a revelação deixada, lógico, para o final. Algo que seria usado até o desgaste no gênero nos anos 2000. Ainda traz no elenco Ruth Gordon [‘O Bebê de Rosemary’|1968] e o garotinho Oliver Robins, o Robbie de ‘Poltergeist’|1982, lançado nos cinemas alguns meses antes.
* * ½ Monteiro Júnior
03.07.20 - YouTube, quarentena covid-19 - DirectorMartin ScorseseStarsRobbie RobertsonMuddy WatersNeil YoungA film account and presentation of the final concert of The Band.O cultuado registro de Martin Scorsese da última apresentação da canadense The Band com a formação original [na época ninguém sabia disso, claro] é um esforço barroco admirável. Celebra a sinergia musical da banda e seus convidados em cima do palco, os imprevistos e as improvisações, ao mesmo tempo que captura o peso – do guitarrista/compositor Robbie Robertson, pelo menos – dos anos de turnês pelas estradas. Artesanato audiovisual puro, com todas as suas imperfeições. Scorsese tinha tudo decupado em storyboards, o que você percebe em algumas apresentações, a música ditando o olhar das câmeras. Mas precisou lidar com a realidade de um show gravado ao vivo – que vira parte da costura narrativa também, como a única câmera apta a cobrir o ‘Mannish Boy’ de Muddy Waters. Por isso assume a feitura por trás das performances gravadas depois, da mesma forma que se coloca em cena durante as despojadas conversas com Robertson e os outros integrantes da banda. Escolhas que sustentam uma personalidade à obra. Pelo palco, passam nomes como Ronnie Hawkins, Dr. John, Neil Young, The Staple Singers, Neil Diamond, Joni Mitchell, Paul Butterfield, Eric Clapton, Emmylou Harris, Van Morrison, Lawrence Ferlinghetti, Ronnie Wood, Ringo Star e até um antipático Bob Dylan. Não é necessário conhecer todos, e sim deixar-se impregnar pela força do show, pela atmosfera, o que representa aquela reunião. ‘A estrada levou muito dos grandes.’ Inegável o fato de que Robertson é o pivô e de que Scorsese se afeiçoou da figura [tanto que trabalharam juntos muitas vezes de lá para cá, a última em 'O Irlandês'|2019]. Pauline Kael e diversos críticos arriscaram dizer tratar-se provavelmente do melhor documentário sobre concertos de rock. Um dos que mais pincelam seu estilo, sem dúvida, celebrando a vibração agridoce de uma despedida.
* * * * Monteiro Júnior
04.07.20 - Telecine Play, quarentena covid-19 - DirectorAndrew PattersonStarsSierra McCormickJake HorowitzGail CronauerOne night in New Mexico, in the late 1950s, a switchboard operator and radio DJ discover a strange audio frequency which could change the future forever.Expor a fonte, o seriado sci-fi de Rod Serling ‘Além da Imaginação’|1959-1964, de forma tão explícita na estrutura narrativa opera como um elemento inorgânico na curiosa experiência proposta por Andrew Patterson e seus pseudônimos. No mesmo tom em que presta homenagem, quebra a imersão de forma pontual, embora não perca em estilo. A abordagem estética do realizador, já dizendo a que veio em seu primeiro filme, sobre o tempo e o espaço diegéticos potencializa o ‘muito com pouco’ com o qual gera, e sustenta, a tensão. São longos planos, alguns planos-sequências, cujos diálogos expositivos são, veja só, o que motivam o nosso interesse e dão a atmosfera. O que casa bem com o universo do rádio no final dos anos 1950. Durante grande parte do filme parece que nada acontece de fato, mas o arranjo dos diálogos vão aguçando a imaginação. Somado a um inusitado corre-corre dos personagens de Sierra McCormick e Jake Horowitz – a habilidade do roteiro em desenvolvê-los ao largo da enxuta duração é outro ponto a se ressaltar –, em determinado momento nos pegamos completamente capturados pelo enredo apenas no que supomos estar se desenrolando. E isso é algo notável. Mesmo quando caminha para um ‘Contatos Imediatos do Terceiro Grau’|1977 indie, o faz sempre com pretensões maiores que a própria produção. Sem perder o aspecto instigante que alimenta desde o início.
* * * ½ Monteiro Júnior
05.07.20 - Prime Video, quarentena covid-19 - DirectorJohn SturgesStarsBurt LancasterKirk DouglasRhonda FlemingLawman Wyatt Earp and outlaw Doc Holliday form an unlikely alliance which culminates in their participation in the legendary Gunfight at the O.K. Corral.Burt Lancaster e Kirk Douglas juntos pela segunda vez, como os mitificados Wyatt Earp e Doc Holliday no Velho Oeste Americano. A versão do famoso tiroteio nos arredores do curral do velho Kindersley, em Tombstone, Arizona, pelas lentes de John Sturges, foca na relutante amizade que vai se formando entre os dois protagonistas, apesar de suas ‘diferenças’ e antipatias um com o outro. Claro, a fórmula hoje é tão puída quanto um velho tapete pisado há séculos. No espectro do gênero estadunidense, porém, é uma delícia, ainda mais sabendo que Lancaster e Douglas ficaram amigos de verdade durante as filmagens e ainda se encontrariam em mais cinco filmes. O roteiro assinado por Leon Uris, sugerido pelo artigo de George Scullin, pode jogar para as cucuias a acuracidade histórica, mas desenvolve com didatismo o evento climático, sem parecer didático, e as singularidades dos personagens. Nesse aspecto, a Kate de Jo Van Fleet se destaca pela maneira como orbita o enredo, e o Billy de Dennis Hopper pelo arco na reta final. A canção-tema de Ned Washington e Dimitri Tiomkin, cantada por Frankie Laine, surge em pedaços de estrofes que ajudam a mover essa clássica história de homens da lei, pistoleiros e aqueles que simplesmente vagam no meio.
* * * Monteiro Júnior
08.07.20 - Telecine Play, reabertura covid-19] - DirectorNacho VigalondoStarsKarra ElejaldeCandela FernándezBárbara GoenagaA man accidentally gets into a time machine and travels back in time nearly an hour. Finding himself will be the first of a series of disasters of unforeseeable consequences.A estreia do espanhol Nacho Vigalondo [‘7:35 de la Mañana’|2003, curioso curta indicado ao Oscar] na escrita e direção de longas resulta num discreto cult do filão ‘viagem no tempo’. O interessante aqui é que com quatro personagens – fora as diferentes versões do protagonista – e uma geografia contida ele parece se divertir diabolicamente acrescentando camadas ao paradoxo desse exercício narrativo. O próprio Nacho faz o assistente de cientista que opera a máquina do tempo, dando ao público dimensões para encontrar profundidade na experiência. Mas é tudo simples e direto, num ouroboro elementar com referências hitchcockianas apontadas em diversas análises. Quase não se fala do amoralismo da premissa, as tentativas bizarras e atrapalhadas do personagem de Karra Elejalde para concertar os próprios tropeços não o legitimam para conquistar nossa empatia. O deleite é puramente voyeurístico, de observar essa comédia negra da desgraça alheia numa espiral em torno do tempo corrompido. É um arco egoísta de um personagem plano, e quem sabe venha daí a sensação de que o filme subverte alguma coisa. Nem tanto. Porém, é uma tentativa instigante de explorar ao máximo os valores da produção. Faltou apenas alimentar a coceira cerebral.
* * * Monteiro Júnior
09.07.20 - Prime Video, reabertura covid-19 - DirectorGina Prince-BythewoodStarsCharlize TheronKiKi LayneMatthias SchoenaertsA covert team of immortal mercenaries is suddenly exposed and must now fight to keep their identity a secret just as an unexpected new member is discovered.Sim, aqueles com mais de 30 anos irão ter vislumbres [involuntários?] do 'Highlander' de 1986, sem a atmosfera existencial da produção com Christopher Lambert e Sean Connery. E, sim, até há abordagens com potencial na construção incompleta da protagonista e sua trupe de imortais lutando pela humanidade, como mercenários das boas causas, sem saber se ainda vale a pena. Ou se valeu alguma vez. Iscas soltas, todavia, na estrutura padrão que insiste em engessar as narrativas de ação contemporâneas num molde que só deixa espaço para garantir sequências. O ‘in media res’ desnecessário, cuja narração de Charlize Theron é um texto de trailer que nem chega a ser retomado, é um exemplo didático. Assim como os ‘setups’ do roteiro inconsistente de Greg Rucka, adaptando a própria hq, já antecipam as viradas até os créditos finais. Salvam-se a direção de Gina Prince-Bythewood [‘A Vida Secreta das Abelhas’|2008], precisando manter o ritmo e a atenção com lutas pouco inspiradas em termos de diegese espacial, o casal de gays em meio aos heróis elevando o conceito das declarações de amor, e a presença de Theron se estabelecendo como uma das melhores atrizes de ação, sem deixar sumir a veia dramática, desde a Furiosa de ‘Mad Max: Estrada da Fúria’|2015. Tudo em volta dela é distração.
* * ½ Monteiro Júnior
10.07.20 - Netflix, reabertura covid-19] - DirectorAaron SchneiderStarsTom HanksElisabeth ShueStephen GrahamSeveral months after the U.S. entry into World War II, an inexperienced U.S. Navy commander must lead an Allied convoy being stalked by a German submarine wolf pack.Além de protagonizar, Tom Hanks adapta o livro de C.S. Forester de 1955 sobre destroyer encurralado na Batalha do Atlântico. Forester é o autor de ‘Uma Aventura na África’, cuja versão cinematográfica rendeu o Oscar de ator para Humphrey Bogart, e até onde de sabe o Greyhound em si é ficcional. O diretor Aaron Schneider [‘Segredos de um Funeral’|2009] nos cola no protagonista e acompanha suas decisões estratégicas, como um jogo de tabuleiro de um player só. Propõe a tensão de forma correta, apoiado no trabalho de câmera e na atuação de Hanks, no ensejo de fazer pouco menos de 1 hora e meia de stress ininterrupto e justificar na própria cinestesia do filme sua duração enxuta. Hanks é daqueles atores que dispensam backgrounds do personagem para criar empatia. Basta estar ali para nos engajarmos à narrativa. Mesmo assim, há um par de cenas com Elisabeth Shue para garantir. O maior problema, portanto, é a cadência de eventos ser ‘sabotada’ pelas transições ‘fade out/fade in’ da estrutura temporal capitular. Marcar o quanto falta para a chegada da ajuda aérea deveria, teoricamente, pressionar o fluxo tensional e não, de certo modo, arrefecê-la. Algo se perde na correria cronometrada e deixa de explodir, a sensação de perigo nunca extravasa o quadro e o descanso final do capitão apenas nos remete aos tipos que o ‘astro’ [pessoalmente, não gosto desse termo] se especializou em interpretar: o bom moço inofensivo jogado numa situação-limite.
* * ½ Monteiro Júnior
10.07.20 - Apple TV+, reabertura covid-19 - DirectorNunnally JohnsonStarsGinger RogersVan HeflinGene TierneyA young writer insinuates herself into the life of a Broadway producer.Segundo filme de Nunnally Johnson assumindo a trinca roteiro, direção e produção. Reitera o ótimo roteirista que foi ao adaptar o livro de Hugh Wheeler [‘Sweeney Todd, o Barbeiro Demoníaco da Rua Fleet’, assinando o argumento como Patrick Quentin] com diálogos lapidados criticando a pretensa sofisticação de artistas e aspirantes numa Nova York de aparências e fofocas. É interessante como a narrativa de Johnson flerta com o noir, porém sem abraçar nenhum gênero específico. Mais curioso ainda é como ele distancia o espectador para que possa ter um olhar analítico enquanto envereda por uma sinuosa teia de aranha. E embora certas convenções entreguem o jogo de forma antecipada – Ginger Rogers recebendo ‘top billing’ com um papel de coadjuvante? –, se você embarca sem pescar os detalhes da trama antes as curvas dramáticas e o protagonista acuado investigando as suspeitas sobre si funcionam com insuspeita atmosfera de intriga. Além de tudo isso, as camadas dos personagens estão o tempo inteiro em mutação até ressignificarmos a viúva negra do título. Um exercício de roteiro à beira do próprio abismo com atuações espertas de todos.
* * * Monteiro Júnior
14.07.20 - YouTube, flexibilização covid-19 - DirectorDavid KoeppStarsKevin BaconAmanda SeyfriedAvery Tiiu EssexA former banker, his actress wife, and their spirited daughter book a vacation at an isolated modern home in the Welsh countryside where nothing is quite as it seems.David Koepp não parece motivado em transformar o livro do alemão Daniel Kehlmann numa experiência menos rasa, genérica e sem atmosfera. Pavimenta a narrativa com escolhas trôpegas, fáceis de antever e com um psicologismo daqueles ‘faz de conta que cola no espectador desatento’. Bem, não cola nem mesmo nele. Vindo de consecutivos desastres, seja dirigindo [‘Mortdecai – A Arte da Trapaça’|2015], seja escrevendo [‘A Múmia’|2017], Koepp se entrega à indulgência de um enredo recheado por furos de lógica e temas que ficam soltos, como se por si só garantissem alguma carga emocional relevante aos personagens. Nem elabora a fundo o ciúme passivo-agressivo de Kevin Bacon e nem como isso se conecta à culpa que motiva os ambientes sinuosos da ‘casa assombrada’ que inexplicavelmente não deixa a família ir embora. Parte dela, pelo menos. É tudo dispositivo de plotagem inorgânico para gerar uma sequência depois da outra, mas sem coesão criativa. Bacon e Koepp se reencontram duas décadas depois de ‘Ecos do Além’|1999, ofuscado à época pela abordagem de ‘O Sexto Sentido’|1999. Agora o novo filme também surge dissincrônico, como toda e qualquer produção 'pronta' do ano passado para cá, engolido no contexto da pandemia. O lançamento em VOD nos salvou de, além dos perigos de contaminação, um filme ruim nos cinemas. Longe, claro, de ser mérito.
* ½ Monteiro Júnior
15.07.20 - flexibilização covid-19 - DirectorHoward HawksStarsKatharine HepburnCary GrantCharles RugglesWhile trying to secure a $1 million donation for his museum, a befuddled paleontologist is pursued by a flighty and often irritating heiress and her pet leopard, Baby.‘Screwball comedy’ raiz por excelência, o clássico dirigido por Howard Hawks segue o fio do enredo amalucado de Hagar Wilde e Dudley Nichols sem receio de perder o timing. Não perde. Nem a narrativa, com pouca incisão musical extradiegética – e isso potencializa o uso inusitadíssimo de ‘I Can’t Give You Anything But Love’ –, nem a dupla Katharine Hepburn e Cary Grant em estado de graça nas suas caracterizações. Ela louquinha e ele atrapalhado, o arquétipo mais bruto do romance cômico cinematográfico que foi se perdendo pelo desgaste da fórmula e a falta de uma ‘mise-en-scène’ afiada no ritmo. Ritmo que é a chave desse filão popular, e ao mesmo sofisticado, dos tempos da Grande Depressão econômica estadunidense. Há muito de um pouco aqui: um casamento prestes a não acontecer, falsa identidade, um dos primeiros usos da palavra gay na conotação moderna, um novelo de confusão que só cresce, uma clavícula intercostal de dinossauro como MacGuffin, um cachorrinho esperto [o mesmo de ‘A Ceia dos Acusados’|1934 e suas sequências], um leopardo chamado Baby para os protagonistas cuidarem. O Clark Kent de Christopher Reeve deve muito ao David Huxley de Grant, que, por sua vez, deve ao comediante do cinema silencioso Harold Lloyd. Hepburn é pura alegria infantil no quadro.
* * * * Monteiro Júnior
17.07.20 - YouTube, flexibilização covid-19, 4 meses em casa - DirectorStephen KayStarsThomas JaneKeanu ReevesAdrien BrodyIn 1946 Denver, an aspiring writer who enjoys irresponsible adventures with his friend writes a letter about his life before and after the suicide attempt by his sad, commitment-seeking girlfriend.Stephen Kay adapta a famosa carta, ou fragmentos dela, escrita em 1950 por Neal Cassady a Jack Kerouac, a qual literalmente ‘gestou’ o estilo ‘datilomitado’ do Movimento Beat. Apesar do constante esforço para sustentar essa ponte, a maior jogada da narrativa de hesitações e autossabotagem juvenis é o ar anedótico que se mantém o tempo inteiro fora do quadro. Colocar Keanu Reeves no elenco de apoio talvez tenha sido a segunda tacada para não fazer o filme passar completamente despercebido. Estreando no cinema, Kay tenta impregnar a atmosfera com o que ele considera remeter ao futuro daquela geração imortalizada por obras como ‘Uivo’, de Allen Ginsberg, e a própria ‘On the Road’ de Kerouac, onde Cassady foi inspiração para Dean Moriarty. O máximo que alcança, todavia, são intenções desencontradas entre a velocidade da escrita original e as titubeações irritantes da história filmada.
* * ½ Monteiro Júnior
19.07.20 - TheArchive, flexibilização covid-19 - DirectorRichard BrooksStarsBurt LancasterJean SimmonsArthur KennedyA fast-talking traveling salesman with a charming, loquacious manner convinces a sincere evangelist that he can be an effective preacher for her cause.Ainda hoje a narrativa de Richard Brooks, a partir do controverso livro de Sinclair Lewis, não separa com clareza didática, certamente de forma intencional, o evangelista do vigarista. Vai do olhar de cada um para os personagens. Jean Simmons, como o contraponto ao efusivo Burt Lancaster, é quem estranhamente equilibra o percurso sinuoso dessa crítica cheia de eloquência retórica. O que não a diminui, pelo contrário, a distancia de fazer concessões indulgentes em cima do chamado ‘revivalismo’ – uma renovação espiritual dos pecadores que, pelo visto, é um negócio rentável. Apesar disso, parece que todo mundo, não apenas a congregação, é passível de ser ludibriado por alguém ou pelas próprias percepções. Lancaster levou o Oscar de Melhor Ator, mas várias vezes sua atuação é irritante. Shirley Jones surge tarde, na pele da prostituta que movimenta o terço final; ganhou o prêmio da Academia de atriz coadjuvante pela atração que constrói rapidamente em torno de si. Lewis enfrentou a fúria das ligas religiosas da década de 1920 com sua sátira. Foi o primeiro estadunidense celebrado com o Nobel de Literatura.
* * * Monteiro Júnior
21.07.20 - Notebook, flexibilização covid-19] - DirectorClaire DenisStarsRobert PattinsonJuliette BinocheAndré 3000A father and his daughter struggle to survive in deep space where they live in isolation.O primeiro filme falado em inglês de Claire Denis é um experimento espacial sócio-psicológico cheio de autoralidade e provocação atmosférica. Redondo, reflexivo, ousado e absorvente, porém nunca da maneira que se espera do gênero. Sem chegar a radicalizar as convenções dos dramas de confinamento e os pesos do passado sombrio. Uma jornada de pulsões sexuais tortas pró-perpetuação da vida humana e conhecimento rumo ao único mistério que resta para esses personagens – a superação do buraco negro numa missão claramente suicida. Denis mistura diferentes razões de aspecto e referências narrativas, de ‘Solaris’|1972 à tragédia de Medeia, e deixa os atores exercitarem seus processos. Encabeçados por Robert Pattinson, cujo esforço faz saltar a veia da cabeça.
* * * Monteiro Júnior
23.07.20 - Looke, flexibilização covid-19 - DirectorMichael O'SheaStarsEric RuffinKarin CherchesChloë LevineWhen troubled teen Milo, who has a fascination with vampire lore, meets the equally alienated Sophie, the two form a bond that begins to blur Milo's fantasy into reality.Bebe na influência direta do vampiro como alegoria, levada ao extremo, da solidão juvenil e do despertencimento de George Romero em ‘Martin’|1978. O novato Michael O'Shea não titubeia em nos alimentar ‘red herrings’, embora nunca nos trapaceie de fato, além de trazer forte carga emocional a partir do encontro entre Milo [Eric Ruffin] e Sophie [Chloë Levine] e homenagear o filão com um pungente realismo social. Atualiza o cenário para as questões contemporâneas do interdito da perda e das referências dos ritos de passagem. Desfolha as camadas sem ansiedade, permitindo que sejamos testemunhas próximas de um estudo de personagens. A câmera muitas vezes reforça esse caráter observacional, ao mesmo tempo que mergulha na escuridão perdida do que o jovem protagonista acredita ser. Indicado ao Câmera de Ouro e Un Certain Regard no Festival de Cannes. Nada mal para uma produção independente inscrita por capricho.
* * * Monteiro Júnior
24.07.20 - Prime Video, flexibilização covid-19 - DirectorVincente MinnelliCharles WaltersStarsLeslie CaronMaurice ChevalierLouis JourdanWeary of the conventions of Parisian society, a rich playboy and a youthful courtesan-in-training enjoy a platonic friendship which may not stay platonic for long.A premiadíssima versão musical da novella publicada em 1944 pela francesa Colette. Alan Jay Lerner escreve o roteiro e assina as letras originais, costurando ação dramática, diálogo e música em cruzamentos balanceados a moverem a história. Segunda vez em que faz essa dobradinha roteirista/compositor, repetindo-a em ‘Minha Bela Dama’|1964 e ‘Camelot’|1967. Vincent Minnelli capricha no colorido da alta sociedade parisiense no finalzinho do século XIX e sua cultura de aristocratas entediados e cortesãs protagonizando manchetes quase diárias. Na canção-título, usa a chamada ‘geografia criativa’ para o Gaston de Louis Jourdan entoar os versos em diferentes, e distantes entre si, pontos turísticos com cortes em raccord, tornando grandioso seu despertar romântico pela protagonista. Mauriche Chevalier basicamente construiu uma persona como Honoré Lachaille, um tipo que lhe deu gás na última fase da carreira. Ainda hoje é preciso lembrar que sua abertura cantando ‘Thank Heaven for Little Girls’ não deve ser levada no sentido, digamos, ‘torto’. A própria autora queria Audrey Hepburn para repetir a Gigi que fizera no palco, mas o papel terminou com Leslie Caron, que consegue misturar ingenuidade e sapequice para bater o pé ante o destino traçado pela grandmamma Madame Alvarez [Hermione Gingold] e por Tia Alicia [Isabel Jeans]. E é elegante como o texto, a direção e as atuações deixam as insinuações sexuais nas frases incompletas. Mesmo Gigi soltando uma direta no moralismo do Código de Produção ao dizer que, quando Gaston terminar com ela, apenas deverá partir para a cama de outro cavalheiro. Venceu todas as nove indicações no Oscar, à época um recorde. Que seria superado um ano depois pelos 11 Oscars de ‘Ben-Hur’|1959.
* * * ½ Monteiro Júnior
25.07.20 - Notebook, Luís Correia, flexibilização covid-19 - DirectorNagisa ÔshimaStarsCharlotte RamplingAnthony HigginsVictoria AbrilA married French woman takes a zoo chimp named Max to be her lover.Embora a naturalização chocante – para o conservadorismo, sobretudo – desse triângulo amoroso incomum [vai ver nem tanto] e ter na realização ninguém menos que Nagisa Ôshima, traz uma mise-en-scène até soft para quem fez belos ultrajes como ‘O Império dos Sentidos’|1976. A ideia partiu do corroteirista Jean-Claude Carrière, o diplomata feito por Anthony Higgins trazer para dentro de casa o amante da esposa [Charlotte Rampling], um chimpanzé chamado Max. Ôshima, filmando em francês e inglês, investe mais na atmosfera de crônica satírica das convenções, e desconstruções, do comportamento sexual burguês. Muitos ‘acusam’ o filme de ser buñueliano demais para o radicalismo que notabilizou o realizador japonês, além de se revelar ‘antivoyeurístico’ a despeito do buraco de fechadura trabalhado pelo marketing. O diretor, ao que parece, chegou a cogitar uma cena na qual fazia sexo oral na personagem de Rampling. A narrativa, por outro lado, caminha para se assumir como uma singela [e alegórica?] história de amor e aceitação do diferente. Em alguns momentos ousada; em outros, engraçadíssima. Mas sempre predominantemente terna.
* * ½ Monteiro Júnior
27.07.20 - Macbook, Luís Correia, flexibilização covid-19 - DirectorArthur PennStarsMarlon BrandoJack NicholsonRandy QuaidTom Logan is a horse thief. Rancher David Braxton has horses, and a daughter, worth stealing. But Braxton has just hired Lee Clayton, an infamous "regulator", to hunt down the horse thieves; one at a time.Na onda dos westerns revisionistas dos anos 1970, Arthur Penn [‘Bonnie e Clyde – Uma Rajada de Balas’|1967] dirigiu um de menos consenso entre os críticos. O fato é que a tentativa do viés psicológico na atmosfera entre os personagens é sempre quebrada pela caracterização destoante, mas inegavelmente curiosa, de um errático Marlon Brando. Penn, que já havia trabalhado com o ator em ‘Caçada Humana’|1966, aqui logo desiste de tentar controlá-lo, deixando-o improvisar da primeira à última aparição – algumas delas bem excêntricas. Brando podia, né? Interessante é que não chega a eclipsar Jack Nicholson, apesar de, claro, parecer um careta entediado diante do colega. E olha que Nicholson, teoricamente, faz o bandido da história assinada por Thomas McGuane. Depois mexida por Robert Towne, não creditado, para ‘acomodar’ Brando caçando os foras-da-lei vestido de mulher e/ou dividindo uma cenoura com um cavalo. Se era para quebrar os cânones do gênero...
* * ½ Monteiro Júnior
28.07.20 - Telecine Play, flexibilização covid-19 - DirectorFritz LangStarsJoan BennettMichael RedgraveAnne RevereAfter a lovely woman and her new husband settle in an ancient mansion on the East coast, she discovers that he may want to kill her.A tendência é reduzir esse trabalho de atmosfera psicológica de Fritz Lang quando comparado a ‘Rebecca – A Mulher Inesquecível’|1940 e ‘Suspeita’|1941, ambos de Hitchcock e com mesma raiz estrutural advinda de fontes diferentes. Até o enredo assinado por Silvia Richards, com base no argumento do escritor e dramaturgo Rufus King, chegar na expositiva catarse psicanalítica, Lang nos envereda com assombrosa maestria pelos ambientes sinuosos da percepção dos personagens. São detalhes que ganham potência dramática no texto de Richards, cuja carreira no cinema foi interrompida pelo ‘caça às bruxas’ mccarthista. O fato de ser uma mulher escrevendo, numa indústria ainda dominada por roteiristas homens, confere às palavras da protagonista, feita por Joan Bennett, uma aproximação especial com os segredos da natureza feminina. E isso percorre todas as curvas da trama, mesmo na surpreendente virada de ponto de vista para o marido [Michael Redgrave], pontuando em agudo o arrepiante terço final. O score de Miklós Rózsa ecoa os segredos distorcidos e os quartos secretos em meio às névoas fantasmagóricas que circundam o cenário principal – os vãos mentais do passado.
* * * Monteiro Júnior
29.07.20 - YouTube, flexibilização covid-19 - DirectorJean AurelStarsBrigitte BardotMaurice RonetChristina HolmeClara becomes a secretary who must cater to all the desires of the womanizing writer Jérôme, while he tries to write his memoirs.Sex comedy dirigida e coescrita pelo romeno Jean Aurel com estrutura de pornochanchada mas sem a ousadia ou o humor de uma. Reta final da carreira de Brigitte Bardot no cinema, o ícone da liberdade sexual feminina reduzida ao pastiche da própria persona, cuja ‘química’ forçada com Maurice Ronet só reluz as fantasias e neuroses machistas. A maior parte do filme se passa num trem, ele a perseguindo para fazer valer um contrato: como secretária-amante deve satisfazê-lo a fim de ‘inspirá-lo’ num livro-memória acerca de todas as mulheres que já amou. Daí o título. Se há uma investigação sobre por que não sossega com uma só – Domingos Oliveira fez isso muitíssimo bem por aqui quatro anos antes em ‘Todas as Mulheres do Mundo’|1966 – fica longe da superfície. Bardot faria mais seis filmes, mal avaliados no geral, antes de se aposentar como atriz.
* * Monteiro Júnior
30.07.20 - Looke, flexibilização covid-19 - DirectorPatrick VollrathStarsJoseph Gordon-LevittOmid MemarAylin TezelWhen terrorists try to seize control of a Berlin-Paris flight, a soft-spoken American co-pilot struggles to save the lives of the passengers and crew while forging a surprising connection with one of the hijackers.A sacada narrativa do estreante em longas Patrick Vollrath, que teve o curta metragem ‘Tudo Ficará Bem’|2015 indicado ao Oscar, é nos confinar no cockpitt por quase uma hora e meia ininterrupta. A tensão depende mais das reações emocionais de Joseph Gordon-Levitt do que propriamente da decupagem da câmera ou de dispositivos cinemáticos inorgânicos. Vollrath não lança mão nem da trilha extradiegética para realçar o suspense, o que é uma escolha ousadamente positiva. Curioso, então, como tanto cuidado com o realismo cinestésico da experiência imersiva não chega a alavancar de fato a dramaturgia do roteiro, escrito pelo diretor alemão e coescrito pelo iugoslavo Senad Halilbasic. Mesmo o cuidado com os personagens e a maneira como vão movimentar a história desse sequestro soam esquemáticos ante a proposta principal da produção.
* * ½ Monteiro Júnior
31.07.20 - Prime Video, flexibilização covid-19